A alma dos anos 90 voltou (e a culpa é da Copa do Brasil)
A redenção de Vasco e Corinthians no mata-mata, a desconexão da Fifa com a torcida e a instabilidade de Xabi Alonso na Champions
Newsletter Meiocampo nº 99 — 12 de dezembro de 2025
Dezembro chegou com a força de um túnel do tempo. As semifinais da Copa do Brasil, com Corinthians e Vasco em vantagem sobre Cruzeiro e Fluminense, resgataram uma atmosfera que parecia perdida: a tensão das grandes decisões nacionais disputadas quase na véspera do Natal. Esta edição mergulha nesse fenômeno e explica como o caos do mata-mata oferece a gigantes em crise uma redenção que a frieza dos pontos corridos jamais permitiria.
Mas o futebol não vive só de nostalgia. Enquanto olhamos para o passado recente do Brasil, discutimos as contradições do presente global. A Fifa tenta vender a nova Copa Intercontinental como um grande evento, mas a realidade entrega estádios vazios e um torneio que soa redundante. Nossa análise questiona: de que adianta empilhar taças se o futebol é jogado longe de quem realmente importa, o torcedor?
Na Europa, a bola também não para. A última rodada da Champions League trouxe histórias de opostos: a ascensão de Arne Slot no Liverpool contrasta com a instabilidade de Xabi Alonso no Real Madrid. E ainda tivemos o retorno de Gabriel Jesus aos gramados e a saga de José Mourinho tentando operar mais um milagre.
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Dezembro decisivo: como a Copa do Brasil resgatou a alma dos anos 90
Calendário de 2025 devolve ao torcedor a tensão das finais tardias e oferece a Corinthians e Vasco a chance de uma redenção impossível nos pontos corridos
Por Felipe Lobo
No dia 21 de dezembro, quase no Natal, teremos a decisão da Copa do Brasil. Não é apenas um atraso de calendário; é um túnel do tempo. Vimos isso acontecer em outros anos. Em 1998, Corinthians e Cruzeiro fizeram a finalíssima do Brasileiro no Morumbi em 23 de dezembro. Em 1999, o Corinthians decidiu o título contra o Atlético Mineiro no dia 22. Já em 2002, a final foi em 15 de dezembro, com o Santos campeão. Por um acidente de percurso, o futebol brasileiro devolveu ao torcedor a sensação de decidir a vida enquanto monta a árvore de Natal.
As semifinais da Copa do Brasil em 2025 envolvem times em momentos opostos. O Corinthians foi ao Mineirão enfrentar o Cruzeiro, único time que conseguiu incomodar Flamengo e Palmeiras no topo da tabela do Brasileiro, terminando em terceiro lugar. O cenário indicava favoritismo celeste, mas o mata-mata tem suas particularidades.
O Corinthians jogou com a convicção de que a campanha do Brasileiro era irrelevante ali. Dominou o início, deixou o Cruzeiro desconfortável e obrigou o time de Leonardo Jardim a buscar o jogo. O placar de 1 a 0 para os visitantes foi construído em cruzamento de André Carrillo, ajeitada de Yuri Alberto e cabeçada de Memphis Depay. O Corinthians controlou os riscos, sobreviveu sem grandes sustos e leva para casa a vantagem do empate.
A outra partida teve cenário similar. O Fluminense, quinto colocado no Brasileiro e classificado para a Libertadores, foi superior ao Vasco ao longo do ano. Do outro lado, porém, estava um time que viveu o ano no caos e vê na Copa uma chance de glória.
O Fluminense abriu o placar em jogada ensaiada com Thiago Silva e Kevin Serna. Mas o Vasco, mesmo na turbulência, mostrou fome. Rayan empatou no início da etapa final e, aos 48 do segundo tempo, construiu a jogada que terminou no gol da vitória de Pablo Vegetti.
Os dois jogos exemplificam como o mata-mata zera a hierarquia de 38 rodadas. No tiro curto, a mobilização de um gigante ferido supera a organização de quem teve um ano mais estável.
O paralelo histórico é o Santos de 2002. Aquele time fez uma primeira fase irregular e dependia de resultados para se classificar na última rodada. O Peixe perdeu para o São Caetano, mas avançou graças à derrota do Coritiba para o Gama. Se o time paranaense tivesse vencido, o Santos estaria eliminado.
No mata-mata, os 25 jogos da primeira fase ficaram para trás. O Santos eliminou o líder São Paulo, passou pelo Grêmio e venceu o Corinthians na final. Nos pontos corridos, seria um coadjuvante; no mata-mata, virou lenda.
Corinthians e Vasco vivem isso hoje: condenados à mediocridade na tabela, mas permitidos a sonhar pelo regulamento da Copa. Ainda estamos nos jogos de ida. A tarefa do Cruzeiro em Itaquera é difícil, e o Fluminense precisará recuperar o futebol que não mostrou no segundo tempo.
Está tudo indefinido, pois no mata-mata a campanha prévia importa pouco. Isso não significa que o Brasileirão deva abandonar os pontos corridos. O futebol precisa dos dois: a justiça da regularidade e o drama irracional de uma final em dezembro. Os dois podem conviver, mas esse cenário levará muitos a sonhar com o retorno de um modelo que víamos naquele final dos anos 90, que criou gerações acostumadas com aquelas finais.
O ano de 2025, acidentalmente, criou uma fórmula interessante: a temporada regular termina, e o palco final fica reservado à natureza do mata-mata, que permite ignorar a constância e premiar quem compete na hora que importa. Vamos aproveitar e, quem sabe, a CBF siga com essa fórmula que já é usada em outros países, com a final da Copa fechando a temporada nacional.
PODCAST MEIOCAMPO #193
No Meiocampo #193, debatemos se a instabilidade de Xabi Alonso no Real Madrid expõe uma rejeição do elenco a treinadores sistêmicos em favor de gestores de ego. Também analisamos como as semifinais da Copa do Brasil em dezembro resgataram, acidentalmente, a tensão decisiva dos anos 90 e discutimos se a Copa Intercontinental da FIFA ainda tem salvação com estádios vazios ou se deveria voltar a valorizar as torcidas locais.
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Alonso balançando, o retorno de Jesus e Mourinho derrota Conte: as histórias da rodada da Champions League
Técnico espanhol vê pressão aumentar no Real Madrid, enquanto holandês ganha fôlego no Liverpool; rodada ainda teve volta de Gabriel Jesus e vitória do Benfica sobre o Napoli
Por Bruno Bonsanti
A Champions League nos entregou suas últimas partidas de 2025 nesta semana e, se não foi a rodada mais palpitante, houve alguns jogos bem interessantes. Em um deles, Xabi Alonso deu mais um passinho para fora do Real Madrid ao perder do Manchester City. Em outro, Arne Slot deu mais um passinho para dentro do Liverpool ao derrotar a Internazionale. E Jesus voltou. Não aquele. O Gabriel.
Xabi Alonso continua balançando
Entre clipes muito engraçados tirando sarro do Micah Richards, o programa da Champions League da CBS também consegue encaixar ótimas análises, geralmente com Thierry Henry. Antes da derrota do Real Madrid para o Manchester City na última quarta-feira, ele lembrou um comentário feito por Gareth Bale quando ele participou como convidado: o Real Madrid precisa de um técnico que gere o time e não um técnico que treina o time.
É uma distinção menos sutil do que parece. O primeiro dá mais liberdade dentro e fora de campo. Tenta podar os excessos para manter algum nível de disciplina e administra satisfação, confiança, tempo de jogo e problemas internos, buscando a felicidade e a harmonia do vestiário. Se alguém se atrasar para uma sessão de vídeo às 8h, tudo bem, desde que resolva na hora que o jogo começar. O segundo prioriza a parte técnica e tática. É mais exigente nos treinamentos, nos posicionamentos e na disciplina e acredita que uma estrutura coletiva sólida, e às vezes rígida, é o melhor caminho para tirar o máximo dos seus jogadores.
E eu não sei o quanto isso é verdade porque qualquer treinador de sucesso precisa ter pelo menos um pouco dos dois, mas é verdade que, olhando para o histórico do Real Madrid neste século, a primeira abordagem funcionou bem melhor (Del Bosque, Mourinho, Ancelotti, Zidane) do que a segunda (Benítez, Lopetegui).
Isso explicaria por que os métodos de Xabi Alonso deram certo no Bayer Leverkusen, onde ele tinha um elenco mais operário, digamos assim, ou mais suscetível a acreditar que uma estrutura coletiva poderia maximizar o desempenho, e estão falhando no Real Madrid. Quando você lota o vestiário de super estrelas, essa mensagem não cola tão facilmente porque parte do que torna esses jogadores super estrelas é a autoconfiança de que é só jogar a bola neles que as coisas vão acontecer. Ninguém chega ao topo da sua profissão sem um pouco de arrogância.
Era notável que a insatisfação com as novas regras de Alonso estava chegando ao público mesmo em meio a uma sequência de vitórias. O que aconteceria se os resultados piorassem? Bom, eles pioraram. O Real Madrid ganhou apenas dois dos seus últimos oito jogos e bater o Olympiacos por 4 a 3 também não costuma encher ninguém de confiança.
No começo dessa queda de rendimento, o clube fez questão de vazar aos jornais de Madri que apoiava Xabi Alonso e os jogadores precisam se enquadrar. A maré, no entanto, ainda não virou e a demissão continua pairando sobre sua cabeça. A atuação contra o City, apesar da derrota, foi boa o suficiente para lhe dar uma sobrevida. Domingo tem o Alavés, fora de casa.
Ponto para Arne Slot
Havia muita atenção sobre como o Liverpool se portaria no primeiro jogo depois das declarações de Mohamed Salah. E se portou muito bem. Não foi uma atuação fenomenal ou avassaladora, mas competiu o tempo inteiro, foi melhor em alguns períodos da partida e não sucumbiu nos momentos em que a Inter tentou reagir. No fim, foi premiado com um pênalti convertido por Szoboszlai, o melhor jogador desta tempestade de temporada e justamente aquele cuja escalação na ponta direita acabou deixando Salah no banco.
O irônico é que Slot armou um time que parece perfeito para encaixar o egípcio, sem ter tantas preocupações defensivas. Formou um losango no meio-campo, com Ryan Gravenberch na base, Szoboszlai pela direita, Curtis Jones pela esquerda e Alexis Mac Allister mais à frente. Salah pode perfeitamente atuar como um dos atacantes no lugar de Ekitiké ou Alexander Isak, que realmente ainda não pegou seu melhor ritmo. Se ficar em Anfield.
A irregularidade do Chelsea
O Chelsea assumiu a vice-liderança da Premier League depois de vencer o Burnley e se candidatou a ser o principal perseguidor do Arsenal. Depois, derrotou o Barcelona com autoridade e arrancou um bom empate com os Gunners. Só que aí perdeu do Leeds, ficou no 0 a 0 com o Bournemouth e perdeu da Atalanta. Por isso é tão difícil confiar neles, apesar do ocasional grande resultado e da coleção (acúmulo) de bons jogadores.
O The Athletic trouxe uma estatística que também ajuda a explicar essa irregularidade: Enzo Maresca realizou 119 mudanças no time titular em 23 partidas, uma média de cinco jogadores diferentes em cada um. Assim realmente é difícil encontrar consistência. Há o motivo clássico, manter todo mundo bem fisicamente, e parece ser uma estratégia mais ampla do clube, que contratou demais e precisa dar um jeito de não deixar que seus ativos se desvalorizem.
Garoto-prodígio
É uma daquelas temporadas em que é difícil falar do Bayern de Munique: eles estão ganhando todos os jogos e meio que atropelando. Uma das novidades, porém, tem sido a ascensão do garoto Lennart Kral, de apenas 17 anos. Contra o Sporting, ele se tornou o mais jovem a marcar em três rodadas consecutivas de Champions League e ainda encaixou outras jogadas plásticas. Antes do seu gol, quase anotou uma pintura costurando a zaga portuguesa. Então além de tudo parece que tem um futuro craque surgindo para deixar os bávaros ainda mais fortes.
O retorno de Jesus
Depois de quase um ano afastado, Gabriel Jesus voltou aos gramados na fácil vitória do Arsenal por 3 a 0 sobre o Club Brugge. Logo de cara, tentou um chapéu e um toque de letra. Não demorou para finalizar, acertou o travessão e criou uma boa chance para Ethan Nwaneri. Considerando a óbvia falta de ritmo, foi acima do esperado. O caminho para voltar a 100% provavelmente ainda não terminou, mas ele pode ser uma opção valiosa para Mikel Arteta, sempre com problemas físicos na sua linha de frente, ou para Carlo Ancelotti.
O Arsenal mostrou a força do seu elenco novamente. Noni Madueke decidiu com os dois primeiros gols — um deles, uma pintura em que enfileirou marcadores e acertou o ângulo. A sua contratação foi bastante criticada na época, principalmente pelo preço, mas, se talvez não tenha qualidade de titular, pode ajudar bastante na rotação. Gabriel Martinelli fechou a vitória com outro golaço e chegou a cinco gols em cinco partidas nesta Champions League.
Bom na Europa x Às Vezes Joga Na Europa
Não tem nada além de estereótipos (e… bom, história) na afirmação a seguir, mas se José Mourinho tem um gosto especial pelo futebol continental, a mesma coisa não pode ser dita de Antonio Conte. O Napoli, campeão italiano, é o clube com mais pedigree que corre o risco de ficar fora dos playoffs, embora ainda esteja dentro da zona de classificação. Principalmente pela natureza morde e assopra da sua temporada. Estava bem na Serie A, com três vitórias seguidas, contra Roma, Juventus e Atalanta, e havia perdido apenas uma vez desde aquela goleada para o PSV. Mas caiu contra o Benfica que conseguiu emendar duas vitórias consecutivas e sonha com a vaga. O problema é que fecha a sua campanha em Turim contra a Juve e em casa contra o Real Madrid, então precisará de mais duas masterclasses de Mourinho.
Como ficou a tabela?
Após seis rodadas, quase nenhuma das potências europeias corre o risco de não chegar ao mata-mata da Champions League. O mais ameaçado é o Napoli, em 23º lugar com sete pontos e ainda enfrenta Copenhague e Chelsea. Os únicos campeões europeus fora da zona de classificação são Benfica, bem na beirinha e dando sinais de vida, e o Ajax, que realmente não está conseguindo engrenar. Apenas três clubes das cinco grandes ligas estão na mesma situação: Villarreal (35º), Eintracht Frankfurt (31º) e Athletic (28º).
A maior surpresa entre os 24 primeiros é o Qarabag (22º), que ainda tem que enfrentar Eintracht Frankfurt e Liverpool, então pode ser que não tenha fôlego para continuar lá até o fim. Mais acima, a Atalanta, apesar das naturais dificuldades na transição para a vida pós-Gasperini, aparece muito bem em sexto lugar. O resto dos oito primeiros são os suspeitos de sempre. O Arsenal está praticamente classificado às oitavas de final. O Bayern, quase. Do PSG, em terceiro lugar com 13 pontos, ao Bayer Leverkusen, em 20º, com 9, ainda está tudo muito embolado.
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A Newsletter Meiocampo conta com duas edições fixas semanais: às terças, exclusiva para assinantes, e às sextas, gratuita para o público em geral. Ocasionalmente, nossos assinantes também ganharão textos extras. Na última terça-feira, falamos sobre as emoções da luta contra o rebaixamento na última rodada do Brasileirão, a crise que explodiu no Liverpool com as declarações de Mohamed Salah, como David Neres se tornou peça-chave na disputa do Napoli pelo título da Serie A e Messi conquistando o título da MLS.
Se a Fifa quer manter o Intercontinental, deveria se esforçar para levá-lo para perto dos torcedores
Esvaziado pelo novo Mundial de Clubes, torneio anual vive cenário deprimente com arquibancadas vazias no Catar; para resgatar relevância, entidade precisa abandonar campo neutro e apostar na atmosfera dos estádios locais
Por Leandro Stein
A criação da nova “Copa do Mundo de Clubes” tornou um tanto quanto redundante o velho formato do Mundial de Clubes, agora chamado de “Copa Intercontinental”. Ciente de quão supérfluo o torneio ficou, a Fifa o entupiu de troféus numa tentativa de aumentar sua importância, o que soa como exagero. Dá para fazer isso de maneira mais natural. E a chave está em um elemento tantas vezes escanteado pelas confederações de futebol: a torcida.
Que não seja mais o carro-chefe da Fifa como seu principal Mundial, a Copa Intercontinental preserva cenários interessantes. Não precisa só limar a competição, por mais supérflua que ela tenha se tornado. O duelo entre Flamengo e Cruz Azul, por exemplo, garantiu um bom choque entre culturas — embora um jogo pobre por si. Só não dá para achar legal uma partida importante para os dois clubes disputada às moscas, com arquibancadas vazias no Catar, restritas a poucos privilegiados que puderam arcar com a viagem — algo ainda mais difícil em tempos de final única na Copa Libertadores.
O sucesso da Copa do Mundo de Clubes no meio do ano esteve ligado diretamente às arquibancadas. O torneio ganhou peso graças à importância conferida pelas torcidas, em especial as de fora da Europa, que se dirigiram aos Estados Unidos. O tom dos confrontos foi dado pela atmosfera ao redor e pela pressão de impor um resultado favorável ao seu continente. Por que não adaptar e reproduzir isso na Copa Intercontinental? Por que manter a fase final do torneio isolada e sem ninguém no Catar?
Por mais que a isonomia no futebol seja importante, neste caso, dane-se a isonomia. E o futebol de clubes se vê cada vez mais saturado de competições em campo neutro, que tiram força de algo fundamental para o interesse, o ambiente de torcida. Se a Copa Intercontinental não é mais o projeto principal da Fifa, e nem precisa ser, deveria se centrar apenas naqueles que valorizam o torneio — os próprios torcedores.
Não tem como ser idealista para pedir jogos de ida e volta, um na Cidade do México e outro no Rio de Janeiro, entre Flamengo e Cruz Azul. Mas quem questiona que o embate ganharia muito mais sob o calor da massa no Maracanã ou no Estádio Olímpico Universitário? Foi uma ideia que chegou a ser aventada em certo momento para o “Dérbi das Américas”, mas não se colocou em prática. Seria mil vezes melhor do que a sensação deprimente de amistoso que se viu nas tribunas em Al-Rayyan.
O mando de campo no tal “Dérbi das Américas” poderia ser revezado, sorteado ou pré-determinado entre Conmebol e Concacaf. Neste caso, discutir se alguém foi beneficiado ou não com o mando é algo menor, quando a competição se vê em risco com estádios vazios. Este modelo de mando revezado é algo que já acontece na “Copa África-Ásia-Pacífico”, aliás. Em 2024, mais de 50 mil pessoas no Cairo viram a vitória do Al-Ahly sobre o Al-Ain. Em 2025, foram quase 50 mil pessoas em Jeddah diante da surpresa do Pyramids contra o Al-Ahli. Muito mais gente que os 7 mil em Flamengo x Cruz Azul ou que os 12 mil em Pachuca x Botafogo.
Para que o Dérbi das Américas aconteça com mando de campo, sendo ainda um equivalente às quartas de final, a Fifa também precisa repensar o calendário da Copa Intercontinental. Não pode apenas enfiar a competição nas últimas datas do ano. Obviamente, há uma questão essencial com o fim da Libertadores em novembro. Mas, neste caso, nem soaria como problema se o Intercontinental fosse definido somente no início do ano seguinte. Daria mais tempo para as viagens entre continentes e pelo menos garantiria uma atmosfera melhor.
Ter o europeu limitado à final também não parece ideal a essa reformulada Copa Intercontinental, mas é o que sobra nessa troca de mercadorias e favores que vigora dentro da Fifa. Do jeito como está, além da premiação em dinheiro, nada interessa o bastante ao vencedor da Champions. A Fifa poderia mexer um pouco com o orgulho, como se viu na Copa do Mundo de Clubes. Com o embate entre culturas. Um eventual Flamengo x Paris Saint-Germain vai ser uma coisa no Catar, mas poderia ser totalmente diferente no Maracanã ou no Parc des Princes. A atmosfera ditaria o tom da competição.
Por enquanto, tudo não passa de vontade de quem sabe que a competição pode ser muito melhor, mas a vê jogada às traças. Enquanto a Fifa não se importar de verdade com a Copa Intercontinental, nada vai mudar. Ou talvez seja de interesse que o torneio suma gradativamente, enquanto ainda pode ser usado como moeda de troca política com algum governo autoritário do Oriente Médio. Perdem as pessoas que gostam de futebol e querem ver essa troca anual entre continentes.
A criação da Copa do Mundo de Clubes, de fato, deixou a Copa Intercontinental em segundo plano. É natural. E depois do sucesso da edição inaugural, ninguém imagina que vá se alterar o formato principal no curto prazo. O mínimo que a Fifa poderia fazer para valorizar o atual Intercontinental era trazer as torcidas para perto de si e exaltar um público que anda cada vez mais negligenciado nas fases decisivas das grandes competições. E a gente sabe como ao menos latino-americanos, africanos e asiáticos podem enaltecer esse ambiente. Se não for para deixar as taças mais próximas das pessoas, talvez o melhor seja mesmo acabar com esse torneio supérfluo e dar o direito de descanso a clubes com calendários supersaturados.
Até sexta!










Excelente texto. Gostei das finais no final também! Emocionante.