Sem liderança e sem rumo
Derrota histórica para a Argentina revela crise de liderança e gestão na Seleção. O caminho para 2026 exige mudanças urgentes e um projeto além do caos.
Newsletter Meiocampo #17 - 28 de março de 2025
BRASIL, MOSTRA A TUA CARA! Em clima de Vale Tudo Remake, o Brasil fica horrorizado consigo mesmo. A seleção brasileira tomou uma paulada da Argentina e desencadeou uma série de reações emocionadas. Falamos sobre o rumo (ou falta dele) da Seleção nesta edição, que também conta com um apanhado do que rolou durante a Data Fifa e você pode ter perdido. Tem também um pouco sobre as classificações de Irã e Nova Zelândia à Copa. Isso além de um giro pelo mundo. Preparados?
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Falta liderança e rumo para a seleção brasileira
Além do placar: a desorganização tática e a gestão da CBF que emperram a Seleção. Rumo à Copa 2026, é hora de trocar o caos por um projeto real
Por Felipe Lobo
Momentos de crise da seleção brasileira fazem com que uma série de clichês pra lá de desgastados e moldados em bile ressurjam. “Ninguém liga para a seleção brasileira”. “Nem sabia que tinha jogo ontem”. “O problema é só ter jogadores que atuem no exterior, precisa convocar os que jogam o Brasileirão” “Não dá para ter jogador de time pequeno da Inglaterra”.
Sim, a Seleção importa e justamente por isso que surgem teorias conspiratórias e uma gritaria imensa. Tudo isso porque importa sim. Ainda mais quando o Brasil toma 4 a 1 da Argentina em um jogo que poderia ser muito mais.
Porque foi muito maior que o placar. A derrota foi dolorida porque atinge de forma intensa a percepção que temos sobre a Seleção. Não é que alguém com o mínimo de bom senso achasse que o Brasil era melhor que a Argentina, mas não se espera ser goleado, ainda mais como foi, com o adversário dando olé aos sete minutos de jogo.
Os albicelestes fizeram com que a seleção verde e amarela parecesse uma Venezuela qualquer - e olha que a Venezuela joga bem mais que isso atualmente. O Brasil já não é como antes, disse Nicolás Tagliafico, em um vídeo que ele fez analisando o jogo. Aliás, no vídeo ele expõe como o Brasil atuou mal, sem parecer ter uma ideia do que está fazendo, enquanto os argentinos não só sabiam como rapidamente perceberam a fragilidade do Brasil.
Há muitos problemas na Seleção e há muitos culpados por tudo que aconteceu. Vamos de dentro para fora do campo.
Dizer que não há bons jogadores é estúpido. Há jogadores de qualidade no time, mesmo que faltem algumas posições, como laterais, por exemplo. Ainda assim, dá para montar times bem melhores. A Argentina mesmo é um exemplo.
Também não faltam protagonistas, uma palavra que adoram usar com um ar de sabedoria que as redes sociais proporcionam. Os jogadores podem até não conseguir ser protagonistas na Seleção, mas são protagonistas em seus clubes. E, de novo, o mesmo acontece na Argentina.
Há uma coisa que falta no Brasil: liderança. Diante de um jogo que claramente o adversário está amassando, é normal que os jogadores tomem atitudes entre si para resolver os problemas, nem que seja de modo emergencial. Mas para isso é preciso que não só os jogadores percebam os problemas, mas que ajam em cima disso, chamem os colegas, tentem corrigir ali antes que a tragédia aconteça. Faltou isso no 7 a 1 e faltou isso contra a Argentina.
Quando Neymar se tornou protagonista da Seleção, ainda em 2011, faltavam jogadores das gerações passadas. Eles ficaram no caminho, como Adriano, Ronaldinho, Kaká. Todos eles deixaram a Seleção antes do que se imaginava. Coube a Neymar liderar o time.
Desde então, Neymar se tornou o veterano. O que é mais incrível é que ele se tornou o único da sua geração que ainda está na Seleção, aos 33 anos. Casemiro seria outro convocável que foi abandonado pelos técnicos, mesmo sendo um jogador de características que o Brasil não conseguiu substituir. Ele poderia ser o líder, porque a liderança de Marquinhos em campo é sutil e não parece um jogador que possa fazer com que os demais mudem a postura.
Faltou atitude dos jogadores e liderança, mas faltou também saberem o que estão fazendo e isso é responsabilidade do treinador. Dorival Júnior assumiu a Seleção há um ano, na data Fifa de março de 2024, e até agora não sabemos que time ele está tentando montar. Nem taticamente, nem em jogadores.
Nesta data Fifa Dorival chegou a dizer que pensava em montar o time em torno de Neymar, que ele convocou, mas foi cortado por lesão. Veja: um jogador que ele, como técnico da Seleção, sequer teve chance de trabalhar junto. Como montar o time em torno de um jogador que você nem teve disponível?
Não discuto que Neymar, inteiro, em forma e jogando, não só tem que ser convocado como tem que ser titular. Daí a montar o time em torno de um jogador que não sabemos em que condição chega à Copa do Mundo – e nem se chega lá – parece um risco muito grande.
A demissão de Dorival Júnior se tornou oficial nesta sexta-feira. Sua saída parece justa: o seu trabalho foi muito ruim e não dá indício algum que sequer há um caminho sendo seguido.
E aí entramos no terceiro problema: Ednaldo Rodrigues. O presidente da CBF geriu muito mal a saída de Tite, anunciada meses antes da Copa do Mundo de 2022. Ednaldo, dizem, queria renovar com o treinador. Não se preparou para sua saída. E quando aconteceu, decidiu por um técnico de peso: Carlo Ancelotti. Faltou só combinar com o próprio treinador.
Ednaldo falou com Ancelotti e ficou esperando. A situação entre janeiro e junho de 2024 mudou, é verdade, mas o erro foi ficar esperando pelo treinador sem nenhuma garantia que ele realmente viria. Sem um documento assinado. Foi um papelão internacional.
Ednaldo gosta de tomar decisões que agradem à opinião pública e, especialmente, seus pares, presidentes de federações. Assim, a escolha de Fernando Diniz foi uma tentativa nesse sentido. Foi um desastre.
Quando Dorival chegou, depois de conquistar títulos em dois anos seguidos por Flamengo e São Paulo, foi no mesmo esquema: aplacar a opinião pública com um nome que não tivesse uma rejeição alta, já que faltava um nome de consenso.
O problema de decisões tomadas assim é que elas são feitas pensando no externo, no que vão achar, não naquilo que é importante, que é o trabalho. O que a CBF quer do seu treinador? Ednaldo diz que dá tudo que a comissão técnica quer. Mas a CBF sabe o que espera? Como tudo no futebol brasileiro, quer apenas que vença, não importa como. E nem sabe por que perde ou ganha.
É possível que o próximo treinador seja Jorge Jesus, um nome que já conhece o futebol brasileiro, tem tamanho e interesse em ocupar o cargo. Resta saber se a CBF sabe o que quer dele.
O Brasil ainda pode ganhar a Copa do Mundo, porque não há fórmula pronta para um torneio tão maluco que dura apenas sete jogos. E é verdade que o Brasil navegou no caos muitas vezes, como foram os dois últimos ciclos vitoriosos, em 1994 e 2002, ou mesmo 1970.
O que não quer dizer que o caos seja um método. A Argentina foi campeã com Lionel Scaloni como técnico quase por acaso, mas as coisas foram dando certo, ele foi ficando e deu no que deu. Nada indica que o Brasil possa repetir isso.
Seja como for, o Brasil tem jogadores de qualidade e pode, mesmo com uma presidência da CBF cheia de problemas, acabar contratando um técnico que consiga achar o time e chegue como uma equipe candidata ao título em 2026. Pode acontecer, mas por enquanto é só um sonho. Tal qual Ednaldo sonha com Ancelotti: distante e improvável. Tá na hora de acordar do sonho e começar a trabalhar a realidade.
PODCAST MEIOCAMPO #118: ACABOU A ERA DORIVAL NA SELEÇÃO
Derrota pesada para a Argentina mostra que Dorival não tinha mais como continuar. Quais os problemas da Seleção, o que pode melhorar e as responsabilidades - dos jogadores, do técnico e da CBF. Passamos por outros destaques da Data Fifa. Você pode nos ver no Youtube e nos ouvir no seu tocador favorito
O que aconteceu durante a Data Fifa?
Muita coisa acontece na Data Fifa fora do futebol de seleções, mas trazemos o que e, principalmente, por que aconteceu neste compilado
Por Bruno Bonsanti
Thiago Motta demitido da Juventus
Faz tempo que a Juventus quer mudar o seu estilo de jogo. Desde a primeira saída de Massimiliano Allegri. É um desejo legítimo, nobre, futebol é entretenimento, então, nos entretenha, mas parece que seu plano para chegar lá é via passe de mágica.
A primeira tentativa foi com Maurizio Sarri. Ele teve uma temporada. A segunda foi com Andrea Pirlo e seu trabalho de conclusão de curso. Ele teve uma temporada. A terceira foi com Thiago Motta. Ele não teve nem uma temporada.
As suas saídas não foram injustas ou absurdas em si. Como agora, a Juventus não parecia prestes a estourar, mesmo sendo campeã com Sarri ou conseguindo vaga na Champions League com Pirlo. É que às vezes demora um pouco mesmo. Poucos treinadores têm tamanho e um estilo tão forte e bem definido que seus times imediatamente jogam do jeito que eles querem. Sarri até tinha, mas sempre seria complicado aplicar mudanças drásticas depois de oito scudettos consecutivos.
A Gazzetta dello Sport publicou que o diretor técnico da Juventus, Cristiano Giuntoli, ficou decepcionado com as respostas de Motta a alguns questionamentos depois dos péssimos resultados recentes, mas achei sintomático que a reportagem do The Athletic, que geralmente traz ótimas autópsias de demissões, não tenha conseguido ir muito além de “o time tava jogando meio mal”.
Ser eliminado da Champions pelo PSV não foi tão imperdoável quanto levar pancadas consecutivas de Atalanta (4 x 0, em casa) e Fiorentina (3 x 0), duas adversárias diretas na briga pelo G4. Além dessa sequência negativa, que incluiu derrota nos pênaltis para o Empoli na Copa Itália, e de ter empatado tanto que virou motivo de piada, Motta havia realmente produzido poucos momentos tão promissores quanto a passagem pelo Bologna que o projetou.
Mas ele também estava conduzindo um trabalho importante de rejuvenescer o elenco, imagino que com o incentivo ou pelo menos anuência da direção. A Juventus frequentemente entrou em campo com média de idade de quatro a cinco anos menor que a dos adversários. Se os últimos meses foram decepcionantes, também é válido questionar exatamente qual era a expectativa da Juventus com um time jovem treinado por um técnico jovem.
Trent Alexander-Arnold com um pé para fora do Liverpool
As especulações em torno da transferência de Trent Alexander-Arnold para o Real Madrid esquentaram, com cada nicho de imprensa fazendo papel que se espera: o espanhol, liderado pelo Marca, crava que acontecerá, enquanto o inglês samba para não tratar como certo um negócio que parece inevitável há alguns meses. Mas meio que deixa claro que, a esta altura, ele é inevitável.
Arnold decidiu não falar sobre o seu futuro em público durante a temporada para evitar distrações. Não funcionou. Isso não é culpa dele: foi o Liverpool quem permitiu que seu melhor jogador, seu capitão e sua prata da casa mais querida chegassem ao último ano dos seus contratos. É uma situação surreal, inimaginável em qualquer clube bem gerido - como, no geral, é o Liverpool -, e eu duvido que um dia será suficientemente explicada.
Talvez porque não tenha explicação, pelo menos, não uma razoável.
O Real Madrid se transformou em um tubarão especializado em atrair jogadores ao fim dos seus contratos. Em três dos últimos quatro mercados, trouxe Antonio Rüdiger, David Alaba e Kylian Mbappé. Não de graça, porque ele troca a taxa de transferências por altas luvas e prêmios de assinatura, mas parece ter curtido essa história de não precisar lidar com outros clubes, mesmo que a novela Mbappé tenha testado a paciência de Florentino Pérez.
Foi nesse mar que o Liverpool jogou o cara que ele esperava que sucedesse Steven Gerrard como representante do torcedor em campo.
A séria lesão de Alphonso Davies
Alphonso Davies sofreu uma ruptura do ligamento cruzado do joelho durante a disputa de terceiro lugar da Liga das Nações da Concacaf contra os Estados Unidos. O que o técnico canadense Jesse Marsch disse que não parecia ser uma lesão muito grave depois do jogo se transformou em um período prolongado longe dos gramados que pode atrapalhar a preparação de um dos países-sede da Copa do Mundo.
Além de com certeza perder a próxima Data Fifa, e talvez até a posterior, não terá pré-temporada antes do torneio do próximo ano. Deve retornar entre setembro e outubro e precisará pegar ritmo com os campeonatos em andamento. Não é desastroso, ele pode muito bem ainda chegar à Copa em plena forma, mas não é o ideal.
Pior talvez para o Bayern, que ainda pretende ser campeão alemão e europeu e perdeu um jogador que, por característica, é insubstituível. Raphaël Guerreiro é um lateral muito competente com vasta experiência na Bundesliga, e Hiroki Ito também pode quebrar um galho. Ninguém, porém, oferece o mesmo dinamismo de Davies - que apenas no mês passado assinou um novo contrato de cinco temporadas para afugentar o interesse do Real Madrid.
O pior de toda essa história é isso ter acontecido em um jogo que é a definição de desimportante. Foi basicamente a opinião do empresário de Davies, Nedal Huoseh. Ele disse que seu cliente não estava apto a jogar e teria sido “pressionado pelo técnico” a estar em campo. Marsch não se pronunciou, mas a Federação Canadense afirmou que “sempre prioriza a segurança e o bem estar dos jogadores” e que qualquer sugestão contrária “não é verdadeira”.
Esse climão entre a seleção canadense e o estafe do seu principal jogador também não é ideal.
León excluído do Mundial de Clubes
A Fifa excluiu o León do Mundial de Clubes depois do seu Comitê de Apelações analisar todas as evidências para concluir o que todo mundo sempre soube: ele e o Pachuca têm o mesmo dono. A decisão foi tomada em resposta a uma contestação da Alajuelense, da Costa Rica, com base nas regras de elegibilidade do torneio.
Segundo o comunicado da Fifa, Pachuca e León não cumpriram “os critérios de multipropriedade definidos pelo Artigo 10 parágrafo 1” do regulamento do Mundial. Esse parágrafo determina, de várias maneiras diferentes, que clubes em relação de influência e/ou poder não podem participar do torneio ao mesmo tempo.
E a Fifa está certa. Isso atinge a integridade da competição. Mas eu queria entender por que ela não liga que eles disputem o Campeonato Mexicano todos os anos e gostaria de ter certeza que em futuros casos em potencial, como, por exemplo, Bahia e Manchester City, ou Botafogo e integrantes da holding do John Textor, ela tomará a mesma decisão ou se vai se fazer de boba que nem a Uefa quando Red Bull Salzburg e RB Leipzig chegaram à Champions League simultaneamente.
Eu gostaria de ter certeza. Não tenho.
Nova Zelândia na Copa: Chris Wood não estará sozinho
Neozelandeses e iranianos garantiam suas vagas na Copa do Mundo, enriquecendo a história do torneio
Por Leandro Stein
A Nova Zelândia talvez fosse a maior barbada entre as seleções classificadas para a Copa do Mundo de 2026. Com a vaga direta enfim concedida à Oceania, os All Whites teriam caminho aberto no continente que dominam. As expectativas se confirmaram nesta semana, com a vitória por 3 a 0 sobre a Nova Caledônia, que assegurou os neozelandeses no Mundial. Mas, indo além da obviedade, a classificação também premia um trabalho bem feito – que poderia até levar a Nova Zelândia à Copa no formato antigo do qualificatório.
Esta é apenas a terceira vez que a Nova Zelândia disputará uma Copa do Mundo. A estreia, em 1982, veio numa campanha em que Austrália e China foram as principais adversárias batidas no caminho – que misturava as Eliminatórias na Ásia e na Oceania. Chegando à Espanha, os All Whites fizeram figuração no fortíssimo grupo de Brasil, União Soviética e Escócia. O retorno se deu em 2010, já com o caminho aberto sem os australianos na OFC, além da vitória sobre o Bahrein na repescagem. Deu para fazer bonito na África do Sul, com os três empates na chave de Paraguai, Eslováquia e Itália.
A volta ao Mundial depois de 16 anos trará um elenco praticamente novo, mas com um protagonista em comum de 2010. Se naquela época Chris Wood era uma promessa de 18 anos, que saiu do banco nos três jogos da fase de grupos, neste momento ele se candidata a tomar o lugar de Wynton Rufer como maior jogador da história da Nova Zelândia. Pesa muito a fase do centroavante, como artilheiro do conto de fadas do Nottingham Forest rumo à Champions League. É o maior goleador da história dos All Whites e está a seis partidas de igualar também o recorde de aparições.
A passagem para a Copa do Mundo de 2026, por si, coroa o grande momento da carreira de Chris Wood e permite que o atacante conduza o país no maior dos palcos. Mas não que esteja sozinho. O elenco da Nova Zelândia possui outros jogadores que, se não têm o mesmo holofote, possuem trajetórias interessantes na Europa. Liberato Cacace faz seu nome na Serie A, ocupando a lateral esquerda do Empoli. Marko Stamenic disputou competições continentais por três clubes distintos, atualmente no Olympiacos.
Para correr por Chris Wood, a Nova Zelândia conta com uma espinha dorsal razoavelmente jovem. Há medalhões reconhecidos no futebol local, como o zagueiro Michael Boxall e o atacante Kosta Barbarouses, mas a base do elenco é bem mais nova. Dos 11 titulares contra a Nova Caledônia, sete tinham 26 anos ou menos. Vivem o auge físico e possuem uma rodagem internacional razoável, além do mais.
As classificações constantes da Nova Zelândia às competições de base, sobretudo aos Jogos Olímpicos, garantiram certa tarimba a vários dos convocáveis. Parte dos atletas atuais esteve a uma disputa de pênaltis de eliminar o Japão em Tóquio 2020, por exemplo. O próprio técnico Darren Bazeley partilha desse amadurecimento: lateral com história no futebol inglês, principalmente com a camisa do Watford nos anos 1990, ele treinou as seleções de base dos All Whites e também trabalhou como assistente da equipe principal. Sua ascensão ao comando foi natural, rendendo a conquista da Copa das Nações da Oceania de 2024 antes da classificação à Copa do Mundo.
Outro fator que auxilia a Nova Zelândia neste momento é a ampliação da oferta profissional no país. Desde 2007, o Wellington Phoenix disputa o Campeonato Australiano e garante um oasis de profissionalismo na incipiente estrutura do futebol neozelandês. Já em 2024, o Auckland FC se tornou novidade na A-League, assim como uma nova fonte formativa para os All Whites. A integração do novo clube já se reflete na seleção: dos 23 convocados para a Data Fifa, seis vinham do projeto, mais do que qualquer outra agremiação.
Não dá para saber o que a Nova Zelândia faria em uma hipotética nova repescagem rumo à Copa, pensando no formato antigo com 32 seleções classificadas. Como indícios positivos, os All Whites já tinham dado trabalho a Costa Rica e Peru nas duas últimas Eliminatórias – o que era um sinal de evolução após a pancada sofrida do México rumo ao Mundial de 2014. O time atual possui mais elementos positivos ao seu redor, além de alguns resultados competitivos em amistosos recentes contra seleções de outros continentes.
A tendência é de que a Nova Zelândia tenha uma vaga constante na Copa do Mundo a partir de agora. Há exemplos de surpresas na Oceania, especialmente no âmbito de clubes, com intrusões pontuais nas competições de seleções. Ainda assim, que o contexto da OFC ajude bastante, há passos bem dados pela seleção neozelandesa. Chris Wood vem aí, e com respaldo ao seu redor.
Irã na Copa: o passo que falta a esta geração?
É difícil cravar qual a “geração de ouro” da seleção do Irã. O time de 1978 foi o pioneiro a levar o país a uma Copa do Mundo, com ídolos locais que já tinham conquistado o tri consecutivo na Copa da Ásia. Duas décadas depois, o elenco de 1998 marcou o renascimento com vitórias muito simbólicas e astros reconhecidos até na Europa, que viveram ainda uma dança final em 2006. De qualquer maneira, em termos de consistência, o Time Melli nunca viveu um período tão estável quanto o atual. São quatro Mundiais consecutivos, já contando a vaga confirmada para a Copa de 2026.
Ao longo da última década, o Irã esteve diretamente ligado à imagem de Carlos Queiroz. O treinador é o principal responsável por fincar o pé dos persas na Copa do Mundo. As classificações para os Mundiais de 2014 e sobretudo 2018 foram inquestionáveis. O Time Melli terminou invicto em sua caminhada no qualificatório à Rússia, enquanto sofreu apenas cinco gols em 18 jogos naquela campanha. Já na trajetória rumo ao Catar, o Irã lidou com mais turbulências, incluindo duas trocas de treinadores. Mas, no fim, sobrou na fase decisiva das Eliminatórias na Ásia e recorreu mais uma vez a Queiroz na Copa.
O desgaste ao redor do treinador era inegável, principalmente pelo contexto de seu retorno. A demissão de Dragan Skocic a dois meses da Copa, por rusgas internas com cartolas, e o pesado contexto político sobre os iranianos no Mundial, em meio aos protestos no país que também mexeram com os vestiários, não deram qualquer tranquilidade a Carlos Queiroz. Também era hora de seguir em frente. Cabe a Amir Ghalenoei conduzir a fase atual, sem perder de vista o talento da geração que amadureceu nesta última década.
Ghalenoei não é um novato na seleção. Como jogador, ele atuou pelo Time Melli em meio à refundação do futebol nacional durante os anos 1990, depois de períodos de esporte restrito a mando do governo. Pendurou as chuteiras em 1997 e, a partir da virada do século, se tornou um dos treinadores mais vitoriosos do Campeonato Iraniano, com cinco títulos da liga. Quando dirigiu a seleção pela primeira vez, todavia, durou poucos meses no cargo. Foi muito criticado após a queda nas quartas de final da Copa da Ásia de 2007, em pressão ampliada pelo título do rival Iraque.
O retorno de Ghalenoei ao comando teve justamente a Copa da Ásia de 2024 como primeiro grande desafio. O Time Melli passou das quartas de final, ao eliminar o favoritíssimo Japão de virada. Porém, assim como ocorreu em 2019, as semifinais foram o limite. A derrota para o Catar demarcou o fim da linha para um time iraniano que era melhor que seus adversários. Desta vez, ao menos, a federação não criou um desnecessário ambiente conturbado. O treinador recebeu o respaldo para seguir à frente da equipe em busca do Mundial de 2026. Um acerto.
Em 29 jogos nesta segunda passagem pela seleção, Ghalenoei sofreu apenas uma derrota – aquela dolorosa contra o Catar. O time já completou mais de um ano invicto, com nove vitórias e três empates desde a eliminação na Copa da Ásia. Curiosamente, os três empates vieram contra o Uzbequistão, mas sem que o 2 a 2 em Teerã nesta terça-feira impedisse a celebração pela vaga na Copa do Mundo, em resultado que também aproximou os uzbeques de sua estreia em Mundiais.
A base titular do Irã é bastante experiente. O time que enfrentou o Uzbequistão tinha apenas três jogadores abaixo dos 30 anos. Em especial, Alireza Jahanbakhsh tem a possibilidade de disputar a sua quarta Copa do Mundo. O capitão, todavia, é uma exceção entre os remanescentes que estiveram no Brasil em 2014. A espinha dorsal iraniana se fortaleceu de fato a partir do Mundial de 2018. São jogadores com cicatrizes de grandes batalhas, por mais que o prêmio de um título asiático ou de um mata-mata de Copa não tenha chegado.
Ainda que a principal virtude do Irã nos últimos ciclos tenha sido a sua fortaleza defensiva, o binômio de talento está em sua dupla de ataque. Ao que tudo indica, Mehdi Taremi e Sardar Azmoun formarão mais uma vez uma parceria bastante ameaçadora em uma Copa do Mundo. Embora distantes do recorde de Ali Daei, ambos aparecem logo abaixo na lista de maiores artilheiros da história do Time Melli. Taremi traz consigo uma carreira mais respaldada na Europa, enquanto Azmoun possui mais repercussão com a seleção. Respectivamente com 32 e 30 anos, sabem que não terão muitas chances mais.
É esse o sentimento que permeia vários jogadores deste Irã, encaminhando-se para a fase final de suas carreiras. Como Azmoun, muitos deles não continuam mais na Europa e aproveitam a reputação para fazer dinheiro em clubes do Oriente Médio. São os casos de Saeed Ezatolahi e Saman Ghoddos, pilares no meio-campo iraniano em momentos importantes. Alguns até retornaram ao próprio Campeonato Iraniano, a exemplo do goleiro Alireza Beiranvand e do lateral Milad Mohammadi, outras figuras bastante simbólicas desde a Copa do Mundo de 2018.
Num grupo que poderia ter suas armadilhas, o Irã conseguiu se impor nas Eliminatórias. Não tomou conhecimento nem mesmo do outrora algoz Catar, com direito a uma goleada por 4 a 1 somente oito meses após a queda na Copa da Ásia. A campanha permitiu que alguns novos destaques surgissem, com as contribuições importantes de Mohammad Mohebi e Mehdi Ghayedi nas pontas – ambos presentes na Copa da Ásia, mas ainda sem espaço no elenco durante a Copa de 2022. São raras caras novas numa equipe que deve ter problemas de renovação dentro de algum tempo.
Por enquanto, o Irã ainda pode se valer dos seus veteranos. E não teria por que ser diferente, diante de tudo o que já ofereceram para a seleção e pela história construída desde então. O Time Melli teve seus bons momentos nas últimas Copas, como a vitória sobre o Marrocos e o empate com Portugal em 2018, bem como a vitória para cima de Gales em 2022. Pelo retrospecto nas Eliminatórias, no entanto, parece ainda faltar algo que simbolize um passo além em relação a outras histórias do passado em Mundiais. O feito que tornará, indubitavelmente, esta a maior geração iraniana da história.
Giro
- Há duas competições nas Eliminatórias da Conmebol: aquela dos times encaminhados na Copa e a dos que vão se engalfinhar pela repescagem. Na parte de cima, entre os seis primeiros, destaque à fibra de um Paraguai cada vez mais embalado. Desta vez, arrancou um heroico empate por 2 a 2 fora de casa contra a Colômbia – que, por seu lado, vem deixando cada vez mais dúvidas sobre seu real potencial. Já na luta pela repescagem, a Venezuela deu um importantíssimo passo à frente, ao bater o Peru por 1 a 0. José Salomón Rondón caminha para se consagrar como o maior herói do futebol nacional na história, especialmente se classificar a Vinotinto pela primeira vez a uma Copa do Mundo.
- A fase principal das Eliminatórias na África passou da metade. Ninguém tem vaga garantida ainda, mas algumas seleções com participações recentes se aproximaram de mais um Mundial. São os casos de Egito, Marrocos e Tunísia. Numa chave em que parecia se complicar contra zebras, Gana conseguiu se distanciar um pouco, assim como fez a Argélia ao golear Moçambique e abrir ótimo saldo. O interesse fica às histórias alternativas. Senegal se vê em perigo num Grupo B frenético, com República Democrática do Congo e Sudão também embolados. Cabo Verde é uma ameaça real à frente de Camarões, enquanto o Gabão está na cola da Costa do Marfim. Já a África do Sul, de boa Copa Africana de Nações em 2024 e invicta há 17 jogos, vê no horizonte o retorno aos Mundiais após 16 anos. Pesa a competência dos Bafana Bafana, bem como o desastre da Nigéria, seis pontos atrás e na modesta quarta colocação do Grupo C, atrás de Ruanda e Benin.
- Japão e Irã se classificaram na Ásia à Copa do Mundo. O interesse maior, todavia, fica para as eventuais estreias e retornos longínquos. O Uzbequistão precisa vacilar muito para desperdiçar os quatro pontos de vantagem sobre os Emirados Árabes Unidos no Grupo A, apesar do risco pelo confronto direto da próxima rodada, no Oriente Médio. O Iraque deu mole nesta Data Fifa, ao passo que permitiu à Palestina sonhar com a repescagem no Grupo B. Neste momento, as vagas diretas pendem à Jordânia, vice-campeã da Copa da Ásia de 2024, e à Coreia do Sul, mesmo com esta fazendo esforço para não confirmar a classificação antecipada nesta semana. Já no Grupo C, apesar da disputa quente entre Austrália e Arábia Saudita, com três pontos na dianteira para os australianos e confronto direto na rodada final em solo saudita, a chance da Indonésia na repescagem é a história fora da curva.
- Tudo bem, a Nova Zelândia tende a manter seu lugar cativo no topo das Eliminatórias da Oceania por muitos anos. Mas não se menospreza o valor de ganhar experiência na repescagem mundial, uma oportunidade concedida à Nova Caledônia. As seleções de base do país já vem pintando nos Mundiais Sub-20 e Sub-17 recentes. Quem sabe não amadureça gente para elevar as perspectivas e, no futuro, peitarem os neozelandeses. O elenco atual se restringe basicamente à liga local e às divisões de acesso do Campeonato Francês, com raras exceções na elite de Israel e da Austrália. O grande nome da Nova Caledônia é Georges Gope-Fenepej, mas sem tantas perspectivas futuras aos 36 anos. O atacante, de 18 gols em 26 aparições pela seleção, teve breve passagem pela Ligue 1.
- Já faz quase uma semana, mas vale ao menos o registro da loucura que marcou os jogos de volta das quartas de final da Liga das Nações. No equilíbrio entre um mata-mata abrindo caminho a título e um torneio que não significa necessariamente pressão pela eliminação, as oito seleções atuaram de peito aberto na medida do possível. Valeu pelas partidaças. Passaram as quatro favoritas: Espanha, Alemanha, França e Portugal. Mas não que as quedas tenham custado o moral de Holanda, Itália, Croácia e Dinamarca – pelo contrário, provaram bons níveis competitivos e certos aspectos de renovação. Aos classificados, a vitrine foi bem aproveitada por gente que reivindica mais protagonismo nos times. Já entre acessos e descensos para a Nations 2026/27, Turquia e Grécia serão novidades na Liga A, enquanto Kosovo pintará na Liga B.
- As Eliminatórias na Europa foram um remendo nesta Data Fifa, como a maioria das seleções disputou a Liga das Nações e apenas algumas puderam estrear pelo qualificatório. Apesar disso, aconteceram resultados importantes, e nem tanto pela Inglaterra, a camisa mais pesada na ativa. Mais interessantes foram as duas vitórias da Bósnia, sobretudo na visita à Romênia, num Grupo H que tem a Áustria como cabeça de chave. A Noruega botou pressão sobre a Itália, em especial por garantir os três pontos fora de casa contra Israel. Em outras chaves, há desafiantes com seis pontos (como Polônia, República Tcheca e Montenegro), mas com os triunfos obtidos diante de oponentes mais frágeis.
- A Liga das Nações da Concacaf já roubou até o destaque da Copa Ouro no cenário continental. E numa edição marcada pelo desastre dos Estados Unidos, o México aproveitou a brecha para conquistar um título inédito. Não é uma geração mexicana que anime tanto, mas ter o comando de Javier Aguirre é essencial para criar esperanças de um time funcional, dado o histórico recente do treinador no Mallorca e seu próprio passado em El Tri. Raúl Jiménez carregou o México na campanha, com dois gols na semifinal contra o Canadá e mais dois na decisão diante do Panamá. É a referência num ataque acima da média para histórico do país, também por Santi Giménez ao lado.
Até a semana que vem!